Notas Visuais

 

Desenhar sempre foi muito mais com a cabeça do que com a mão.

Um processo cognitivo ligado mais ao observar do que ao fazer — e definitivamente não se torna mais fácil por isso. E tentando simplificar divido o ato em duas etapas: a de compreender e a de como transcrever a ideia ao papel (ou pra pele, tela, madeira).

Transcrever ideias nunca foi muito simples, mas com estudos, técnicas e muito treino passou a ser um processo menos sofrido. Durante minha vida fui aprendendo essas formas, esses atalhos e gambiarras para tentar ilustrar o que tinha em mente. Como costumo pensar: pra tudo dá-se um jeito, e se não sei fazer por um caminho busco outro. Procuro ferramentas que facilitem, busco referências; copia, cola, distorce, muda aqui ali, inverte, subverte e dá-se um jeito. Desenhar é como um diálogo e busco estar atento as respostas. Se um papel não responde bem, muda. Se com lápis fica feio; pincel, caneta, computador. Se não sabe fazer, acha alguém que saiba, pergunta, estuda, absorve. Treina e exercita. A parte prática se resolve praticando /o fazer se aprende fazendo. É um caminho longo e sem ponto final, que flui de uma forma construtiva, passo a passo, sem fim nem começo. Parece bobo, mas vejo mesmo simples assim. Erra, tenta, procura, experimenta e dá-se um jeito. Como já diria o filósofo: “pipoca não tem perna e pula”.

Mas é a primeira parte que sempre pegou pra mim. Observar, pensar, discernir, entender e digerir, para daí então traduzir. É nisso que me bato e apanho. Onde gasto a maior parte do tempo nos projetos e onde por mais que eu me dedique e exercite, será sempre um campo novo e em constante mudança. Vejo isso claramente no meu sketchbook, com traços de pensamentos soltos e rascunhos de ideias vagas, não de obras. Tanto que por muito tempo até fugia de materiais caros e papeis bons, pois achava um desperdício gastá-los com traços tão perdidos. Faço rascunhos tão levianos que um guardanapo ou resto de papel ofício já tá de bom tamanho. Me sinto mais confortável com materiais cotidianos do que um Fabrianno para deixar fluir ideias.

Também nunca tive um caderno com desenhos finalizados ou minimamente estruturados, daqueles que não dão vergonha quando alguém te pede pra ver. Claramente não sou daqueles desenhista cheios de trabalhos bonitos e feitos com calma, imagens apresentáveis. Isso é raro de acontecer. A real é que passo mais tempo pensando em desenho do que desenhando e o sketchbook torna-se apenas uma pequena materialização desses fluxos. No meu caderno não se encontra algo com começo e fim, só uma bagunça de fragmentos espalhados pelas páginas. As linhas se sobrepõem e as folhas se enchem com traços daquilo que vai passando pela cabeça, e já que meus pensamentos não são lá muito organizados isso acaba visível no papel. Como não são conclusivos, nem linhas nem pensamentos, sobram riscos pela metade e composições abandonadas que acabam sobrepostas por outras investigações, que eventualmente acabam migrando para outra folha, ficam esquecidas ou se perdem no emaranhado das linhas de grafite.

Restam só indícios, rastros do que se passou por ali. Uma visualidade que apenas sugere um processo de busca. Vez ou outra continuo o raciocínio, finalizo um desenho, mas na grande maioria das vezes aquele amontoado de folhas são só memórias de um esforço em construir visualmente algumas idéias. E é nesse exercício de pensar em como fazer, como compor, como estruturar em símbolos algumas idéias abstratas que dedico o maior tempo do meu desenho.

 
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