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VOX

 
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as palavras me ocupam e eu me ocupo delas. territórios, eu e elas, concomitante e constantemente a nos afetar. fio e agulha se con-fundem na costura. da paz à guerra tudo nelas se atravessa. inclusive nós atravessados. nós atravessadas. as mulheres na garganta. milhares em mim. todas as que vieram antes pra que toda essa gramática, essa semântica, essa linguagem também pudesse ser anunciada, dita, ocupada, rugida, gritada, remexida, (a)brigada por e em nós. e todas as milhões de mulheres atravessadas. nas mãos e nos pescoços e nas avenidas em veias abertas saltadas na voz e peito ofegantes de quem finalmente descobriu que pode falar. a multidão de mulheres despertas. aqui. e toda a força da língua que me ensinaram viva. lúdica. lúcida. a potência dos signos. e o dever de senti-las,
todas
essas mulheres
fervilhando
inquietas
atravessadas
na garganta
e na voz
e nas mãos
e nas veias e
no peito,
o dever de senti-las antes mesmo de sabê-las é reivindicar a caneta pra lhes devolver corpos e contornos no agora. as mulheres atravessadas na garganta me pedem pra dizer: a gente vai parir muitas (e outras) vidas no lugar dos espaços, dos silêncios e das palavras antes feitas pra invisibilizar, excluir, matar, entristecer. aprendemos, aprendi. narrar é ato de poder. e do lado de cá, encurto a rima pra oração finalmente correr: as mulheres que me habitam saúdam as mulheres que habitam em você.

Hanna.


 
 
 
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Foi a partir desse texto escrito por ela que começamos a pensar no projeto, em como deixar toda essa energia gravada em seu corpo. Falar de palavras, de tantas palavras, tão profundas… mas sem usá-las. Muitas delas vieram na conversa: ancestralidade, discurso, poder, responsabilidade, espiritualidade. mas nenhuma que trouxesse sozinha tudo que deveria ser dito, toda a carga semântica que motiva esse projeto.

 
 
 

“É sobre honrar as mulheres que vieram antes abrindo caminho pras liberdades do agora; é sobre saber o poder da palavra, do discurso, de ocupar e ressignificar os espaços com outra narrativa, outro corpo, outra voz; é sobre a responsabilidade de continuar o que elas, tão anônimas na memória coletiva, começaram”.

 
 
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Partindo dessas ideias, fui buscar referências na ancestralidade, nos discursos perdidos em outros tempos, tempos de outras falas. E tatuagem é isso, é história contada e recontada, até o ponto que já não se sabe mais quem, quando, ou onde isso tudo começou. Uma comunicação tão eterna e efêmera quanto os corpos que a carregam. Alguns desses, por sorte, permanecem por 3 mil anos como a múmia de Amunet, de onde busquei inspiração para os grafismos nesse projeto, como um resgate das histórias que se perdem no tempo.

Em um movimento que se torna vários, cíclicos, pra dentro e pra fora, convergente e divergente, em todos e um só tempo conectando tatuagens que já estavam ali próximas — o pássaro e o barco, agora e pra sempre ecoados. 

 

“mar que brota no peito e cresce crista e curvas subindo a garganta e desaguando em boca. Peito. Lugar do pulso da vida. nascente. Porto também.”

 
 
 
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O som que se emite ao fazer vibrar o ar que vem de dentro, a voz, agora gravada em corpo vivo, que se desloca (e quer deslocar) o mundo e se (re)conhece nesse movimento.


 
 
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